sábado, 20 de agosto de 2011

despendida



Várias luas se passaram desde o dia em que ele, num tom seco ao telefone, disse para deixá-lo em paz. Desde então, o silêncio e a lembrança fina da noite em que sentados no passeio e pressentindo a longa separação que sucederia, viram o dia amanhecer, tendo ambos a cabeça pendida, como uma barda frouxa deixa à vista o desmoronamento. A luz, também frouxa, do dia que não quis se atrasar, impôs o último sorriso, fixado no portão da casa dele, quando a deixou entrever, tal qual uma vela num túnel escuro, um sopro de calor logo eclipsado pelo olhar morto. 

Não era possível retornar lá onde o desejo a reteve nos primeiros passos porque todo o sentimento, dito mais puro, trazia o peso de um fim sentido, sem mesmo ter sido desde o início anunciado. O peso de um fim presente desde os seus mais jovens olhares, desde os seus mais virgens afetos, desde os seus mais crus sentimentos. O fim estava lá desde o prelúdio e estar ela abraçada à raiz só tornou mais profunda e sufocante cada partida.

Ela não sabia agir no torpor, apesar de tentar feito cega tateando a superfície, criar uma forma que a mantive de pé. A sensação era nova e estranha e trazia uma felicidade que sabia falsa, ilusória, irreal. Reticente e temerosa, se fechava como as flores se escondem do sol. Isso a tornava contraditória, porque havia um brilho novo no olhar, além de deixar escapar suspiros de alegria e abraçar com suas pernas a cintura dele, feito bicho que da plena inconsciência de não se saber nu, está nu. 

No momento anterior à despedida, quando ao pedir uma última noite, um último encontro, ergueram o último olhar, ele prolongou o silêncio até vê-la em desespero, para somente aí, neste ponto em que se encontrava, ir tê-la em seus braços, com uma força que a sufocou. Por que faz isso comigo, perguntou? Alguns longos minutos se passaram assim, com o mundo paralisado no peito deles, retido, suspenso, prostrado com os cílios cerrados, para deixá-los tal qual uma estrela no universo, na solidão do último beijo.
 

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