domingo, 25 de abril de 2010



o personagem se vê detido por um bicho no breu, na noite. é preciso dominar o pânico para viver, dominar o medo, dominar o choro. o momento, de renascimento, está tomado por névoa. não contém um céu aberto em estrelas ou chuva fina de batismo. é cru. você não o percebe, não entende o sentido, pede a morte. a morte é sempre uma aliada nos momentos de desespero, um consolo, um descanso, uma porta para o infinito descanso, para o paraíso profundo do Bem que te aguarda, que te acolhe, que é você, enquanto ali no beco um menino te segura firme o braço e puxa para o pavor da barbárie. é cru. é cru feito ovo. feito leite. feito mel. feito sangue. é cru feito a vida. mas o renascer está em todos os dias, em todos os suspiros, em cada gesto, em cada confronto, em cada abraço, em cada medíocre ato em que insistimos em mantermo-nos na inércia. os dias se sucedem. o personagem chega em casa, cansado pela noite em que o bicho lhe reteu estático no nada. ele senta no aconchego da casa quente, à mesa um prato com pão parece já lhe aguardar e a moça, aquela que, esperamos, será a sua amada, lhe sorri, agradecida pelo retorno. o amor é ato de eleição, de auto-consciência, de desprendimento de si. houve o sacrifício, antes, para que você chegasse ali. o sacrifício de milhares de anos, de milhares de corpos. você não entende. está sentado envolto de livros, leu Platão, Kant, Marx, Nietsche, Froid, Sartre, pensou ser uma questão de gênero, chegou a Beauvoir, foi à poesia de Pessoa, ao existencialismo oriental de Hesse, pulou das letras ao silêncio, rumo a Wittegstein, largou as religiões, quase abandonou as letras, o trabalho, o amor, em busca de mar, em busca de silêncio. a Busca, sempre Ela. mas as águas estão revoltas e cheias de sal. não te surpreendem, é certo! as águas nunca te surpreendem porque compõem o corpo, a flor, o oxigênio, os olhos. quando escreve, é oração de silêncio. é método de representação do vazio. enquanto morre, escreve – deixa de ser através da escritura. cabe ao Criador explicar todas as contradições do ser-no-mundo? você não sabe nada, afora os campos de abstração que aprendeu a dominar através da cultura, no mais, é só deserto. viaja, se hospeda em pequenas pensões, casarões antigos. queria se mudar para uma cidade medieval, só pra habitar uma casa milenar e seus fantasmas, suas estórias inscritas nos tijolos, nos cemitérios. o cinema te consola. agnes varda, marguerite... as mulheres. gosta das mulheres e seu campo de visão, seus tons. o filme acabou. não sabemos o fim do personagem. ele se mantém, agora, como incognita. fosse eu, daria mais verbo. sou um ser da linguagem, sem dúvida. mas o silêncio do personagem me incomoda, me devora. apesar de ser toda silêncio. me dão a palavra, na vida real. calei o meu ser político ou ainda não aprendi a fazê-lo - não enquanto estiver aonde estou, sob tais condições. não enquanto me conceber como ser-no-tempo-e-no-espaço, campo social de fome - os meninos morrem, como se morrer aos doze fosse ato de vontade, ou como se pudessemos nos contentar com a cínica indiferença da conformação existencial com a morte nos primeiros anos da mísera existência humana. (mentira?) mas vou votar nas próximas prévias. extamos de fato inscritos em classe? estamos de fato inscritos em gêneros? em que temos nos transformado? quero morar na casa de sol de hilda hilst. ou na casa da lua. não posso ir muito além dos limites desta sala, deste sofá, deste travesseiro, deste corpo, senão pela palavra que se propaga, que se despreende e te toca, te lambusa, te agrega. o tabuleiro de xadrez está ali no canto, aguarda novo ato. fui devorada muitas vezes. mas um dia aprendo a dar xeque mate.





quarta-feira, 21 de abril de 2010

o mar


a caminho de conquista,
ou a caminho do sertão,
ou a caminho do mar ...

a vontade de escrever é anterior à necessidade de dizer. não há verdades descobertas a compartilhar a cada novo ritual da escritura. é uma pulsão – menos simples do que uma composição harmônica que já no corpo da letra habitasse, ou um touro contido prestes a entrar na arena; não – mais aproxima-se ao bafo quente e úmido do mar. tenho os pés nas primeiras ondas e os ouvidos inundamos nas profundezas do anil. os olhos fitam o movimento e não há nada atrás ou ao lado senão a imensidão. o vocabulário, as conjunções, a ortografia, as rimas, insólitas gotas aleatórias, imprecisas, como o pequeno pedaço de terra que meus pés acabam de pisar – dão suporte, mas estão abaixo da planta. faço isso com certa freqüência, no mar: me ponho de costas para ele e olho por baixo das pernas por longo período. com isso impulsiono nova composição, que desconstrua o conceito da palavra (a)mar. como um bicho preguiça, como um peixe. o que me impede de cair no céu, assim? o céu se incorpora como abaixo do corpo (somos seres com olhos retidos no chão). por fim, resta eu e a atração das marés. não há nada a escrever – escrever é um ato de busca como a leitura, um ato de procura e de ínfimos encontros, raros tal qual o encontro com o amor. o amor lê um livro debaixo das cortinas brancas – o amor e as cortinas lembram ondas. suas sombras se projetam na parede. essência de sândalo. posso deixar de ser quem eu sou ou melhor, posso assumir, enfim, o que acho que é da minha essência ser. essência de mirra. a mirra é uma árvore que atinge cinco metros de altura, espinhosa, com flores rubras e amarelas e frutos pontiagudos. espinhosa e pontiaguda. sou eu. nativa do nordeste da áfrica. sou eu. gosta da exposição ao sol. sou eu. propaga-se por sementes, na primavera. espinhosa e pontiaguda. essência de mirra. o amor agora dorme. e o mar, já longe, memória, mantém-se no eterno estado de ondas, como minhas cortinas quando as janelas se abrem para deixar um pouco de sopro entrar – silêncio


 

sexta-feira, 16 de abril de 2010

segunda-feira, 12 de abril de 2010

sexta-feira, 9 de abril de 2010

"la condición más preciosa del creador. el fanatismo. tiene que tener una obsesión fanática, nada debe anteponerse a su creación, debe sacrificar cualquier cosa a ella. sin ese fanatismo no se puede hacer nada importante." (sábato en 'el escritor y sus fantasmas')

" la creación artística se assemeja en ciertos aspectos a la contemplación mística, que puede ir también desde la oración confusa hasta las visiones precisas." (delacroix)

quinta-feira, 8 de abril de 2010



lo inesperado, cuando sucede, ¿qué hacer?
venga hacia adelante, que sea manifiesto, respira sus palabras ... hay un vasto océano de mi ventana en San Salvador. tú duermes allí, pero aún es capaz de mantenerme despierto, como las olas que nunca duerme ...

quarta-feira, 7 de abril de 2010

caminando por las calles en y con buenos aires









nadie duerme en la carreta que lo conduce de la cárcel al patíbulo, y sin embargo todos dormimos desde la matriz hasta la sepultura, o no estamos enteramente despiertos. una de las misiones de la gran literatura: despertar al hombre que viaja hacia el patíbulo. (donne)

difícil transformacion de mi historia para encontrarme en el mundo. son tiempos de intemperie en que me he movido en este contorno de mi misma. un tiempo de fantasmas, pero tengo la convicción de entrever campos de fidelidad a mi condición – un continente lleno de cojeturas, pero al menos ahora es el producto de mi voluntad. ha llegado el momento de decir adiós a ciertos cadávares que, como extranjeros solitarios y desamparados, ha borrado una imagen falsamente familiar de mi. encontrome siempre una extrajera solitaria, mismo cuando en otras arquitecturas de buenos aires. no ha seguridad, y si la quiebra total de la liberdad: ¡ironia! como se un asaltante, con su desesperanza y miedo mi ha abierto el cielo y la tierra; no hay nada y nadie: ¿qué hacer? difícil relatar en el dominio de la literatura mis convicciones, enbarco en tierras lejanas, busco otros espacios, otras línguas, reflejo del diario de una crisi – ¡vivo nesta condicion! como sábato, “no soy un filósofo y dios me libre de ser un literato; son la expresión irregular de un hombre [una mujer] de nuestro tiempo que se ha visto obligado a reflexionar sobre el caos que lo rodea”. no bastame un sentido absoluto como algo fuera de nuestra cárcel; tambien el opuesto, el hombre concreto solamente, no bastame. ¿por onde camiñar? tengo pasiones y mezquindades y voy lejo encerrada en mi torre... como en uno sueño, por melancolía (y tal vez por temor), ¡no soy piedra! (vivo en una ciudad abstracta). ¿la soledad? realidad de la lenguaje, voluntad de la lenguaje, verdad de la lenguaje. pero la comunicación no se hace solamente por la lenguaje, o la lenguaje es más que letra – és amor, amistad, sexo, arte – desencantamiento y resurgimiento del mágico, insurrección de la poesía. ¿la poesía?, paradojo: és, contra o que muchos piensan, exceso de la razón, pero tambien és la manera de expressar la intimidad más profunda de si mismo.




domingo, 4 de abril de 2010


en buenos aires prevalece otros fundamentos...
sábato me hace compañía,
me ayuda a sobrevivir en esta ciudad.
vos estás más lejos ahora
,
pero yo me encuentro en mí...

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Dia da mentira





É impossível a qualquer um pensar já conhecer suficientemente a sua própria geografia sem percorrer as ruas mais estreitas, fugir às grandes veias e adentrar as ínfimas vias; sem eleger a menor das portas, qualquer uma daquelas que vá se estender em outras tantas.

Uma porta de madeira velha range e se abre para um pequeno cômodo, na presença do sol; há lençois pendurados separando os quartos, a cozinha e o banheiro, da sala, que abriga um sofá já velho de vermelho desbotado, uma mesa de compensado carcomida por cupins e uma estante repleta de pequenas tralhas.

Uma velha senhora, sozinha, sentada num banco de madeira com o braço escorado no fogão de lenha, sustenta o queixo enquanto contempla os olhares envidraçados das largas vias que buscam rapidamente daquelas margens cinzas escapar. Cabe considerável conjectura aquilo que de fato pode ocorrer. A senhora ouve o trepidar do fogo aceso e futuca a chama com um dos galhos estendido na superfície de barro.

A existência da velha senhora, dentro da velha casa, escondida no subterrâneo espaço, parece ser um lugar para, depois de superado o medo inicial, poder acalmar-se numa xícara de chá? O que virá depois? Você não entende como chegou até ali e quem pode vir a ser este ser que te acolhe em silêncio.

Ela te diz para não temer, mas também ela teme e clama pela sua menina. Ela veste um vestido simples, cinza, com estampa floral e usa sandálias abertas nos pés; tem os pés calejados, as mãos gordas e o olhar sereno. Enquanto ela remexe o fogo você observa um pássaro se formar na chama e sumir rapidamente ao bater das asas.

Coma um bolinho, ela diz. Você come. Coma outro. Você come. Tome um gole de chá. Chá de folha? Não gosto. Mas esse eu ranquei do xaxim. Você toma. Você se senta. O que você faz ali? Quem é esta mulher? Um estrondo. O pavor te toma, uma porta se fecha, suas pálpebras, e um túnel se abre.

Uma grande via te absorve. Você está dentro de um carro, agora, e de olhar envidraçado avista o barraco da velha senhora. Ela continua lá dentro mexendo o fogo, te olha enigmática e sai pela porta do fundo, uma via que talvez se revelasse para você logo em seguida. Mas logo em seguida não ha mais para você, ali.

Você se afoga na larga avenida, de volta ao confortável centro, despejada no fluxo. Na esquina uma menina segura uma pedra, talvez seja a filha da velha senhora. Você pensa em parar, recuar e buscar entender, mas a velocidade deixa escapar o desejo e te faz seguir em frente. A velha geografia se abre, aquela que você pensa seguramente habitar.

O fogo, a senhora, a menina, todos os becos e portas passam a compor apenas um campo onírico ou um tempo pretérito. O dia de hoje será o dia da mentira porque já não existe mais. Apagar o fogo e molhar a brasa.

Mas o chá era saboroso. E também o olhar da velha senhora. 



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