domingo, 8 de novembro de 2015

--> ESTE DESCONFORTO, Zé, de te saber longe tem hora que pesa mais do que pouco tem hora que se estica pro norte, procissão pras colheitas, penitência de chuvas. mas o tempo some quando o vício de querer despenca a dor – fico grande na sua boca. te tiro de ouvido. te rasgo em olhar. de quente me firo. você sabe o quanto cresceu de água em meu corpo desde a sua nascença? num era eu n’outro dia – era você-em-mim, querendo viver. não se cansa nunca, amor?, vem deitar. (aprendi a dormir respirando você) tudo morreu três quadrados quando suspendi o braço em adeus. no cosmo mais uma estrela jorra morta pra milênios de luz. empresta ao meu corpo sua rede, deixa eu dormir na tua boca? nunca mais tive sombra, tua falta esse desmantelo de sol. saí do meu campo claustro e me prostro gentil dentre suas coxas - consigo ser mais do que puta! bobagem. me lambe a boca, me impede pensar. Zé, apaga esse diabo de luz, vem deitar. sumiste há algumas eras mas vou te encontrar. agora esses pensamentos fora do corpo e sem salvação. no músculo ainda se veste um resto querer. nos dedos buracos. haverá tempo pra isso no mundo? o que pensa minha mãe oxum disso tudo? um desvario atravessa o ventre comedido prostrado. eu sou negra índia perdida nesse resto caatinga. você nada disse e eu fúria, em silêncio fiquei. só soube depois. os teus cheiros ainda me ofuscam. ontem senti sua falta na janta. comi só e à luz de vela, para me duplicar em sombra, neste apartamento cheio de fantasma e gemido. nossos corpos ainda uivam em ondas pela eternidade. quando te conheci um rio corria embaixo de nós. entorpecimento nos pés. ninguém passava ao largo escuro. havia uma ponte. e agora esse horizonte de concreto e cinza sem fim no céu e no seu fitar. e eu pensava que era preciso mas já agora não posso voltar. havia dor no mundo e inda agora e amanhã haverá. tento explicar, não consigo. quando você virá? a rede está vazia na sala. Zé, vem deitar.

quarta-feira, 1 de julho de 2015



há justa distância
ou ajustar a distância
entre olhos que se querem ver?


acolher de forma inventiva
este quadro aberto
em que um corpo
se lança n'outro
para em um movimento seguinte,
próprio ao ato de existir,
serem tornados hóspedes
de novas paisagens.


os afetos não se fecham em dispositivos.

não se trata de um plano delineado,
mas um tornar-se a partir da alteridade.


sentido transitivo e impessoal
deste ritual
instaurado
entre-corpos.


linhas in(di)visíveis de um território
sem
front eiras.





terça-feira, 23 de junho de 2015

minha nova casa




Há algum tempo este formato de blog já não comporta os múltiplos vôos.
Então resolvi criar uma página onde pudesse espelhar em um só lugar um pouco de quase tudo.
Acho que não chego a deletar esta casa, por puro afeto... e há textos aqui que não guardei em outros cantos. Mas te convido a fazer pouso também por lá...!

Para conhecer, clique aqui.






quinta-feira, 11 de junho de 2015

Não tem remédio



Se em cada canto de encontro
tecia um buraco sem fundo,
pensava um elo além deste poço,
mas não. Cada qual no seu mundo.

A noite é sempre essa imensidão
e o tempo exíguo do revés
não atenua essa vastidão.
Marés.

Nem por isso o que se pretende dito dita
silêncio. Ser tao é maior que a fome -
Terra em Transe, Raso de Catarina.
Pretexto sem fim era seu nome.

Se é distância que pede, toma
- sua palavra final, seu guia.

Nesta soma: nadou de sobra afasia
e se ausentou (desde quando?) Magia.

quarta-feira, 3 de junho de 2015

Fuga inautêntica



É claro que nenhuma mulher
pode pretender sem convalescer
estar em um lugar  além mar
além ser  do seu sexo.

Ela pode ser ou não ser transcendente,
dirigir navios, atravessar continentes
considerar um se depois de si
sem ser tomada como um Outro
imanente?

Em se opondo
é que se põe
em ser

sábado, 7 de fevereiro de 2015


o seu silêncio
diz. a minha palavra
está de passagem.

nem há tudo
que sirva mais do que
um pouco reter.

quando inda te tenho
com o corpo cravado
em mim,
te deixo partir.

o seu talvez
cega.

ou sou em mesma brasa
que se auto-inflama
incapaz de uma tal vez
em rubras chamas?

vou-me embora pra Pasárgada.



quinta-feira, 22 de janeiro de 2015


o imaginário carrega lama
na sola dos sapatos.

passo a vez,
passo ao largo,
passo fundo.

superfícies quase táteis corroídas feito aço
por sonhos de quem não sabe dar uma volta
sequer, sem tropeçar em pássaros.



quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

uma odisséia no espaço

os dias encharcados de verão e asfalto
na frivolidade e leveza
de quem acaba de chegar do mar
e inda soletra verbos molhados de sal.

mesmo quente, tempo nublado

desde um quando breve. o guerrilheiro partiu
levando consigo outubro e primavera
deixando ao largo, em febril
espera: o amor sabe ser rude.

estou mais esquiva do que antes,

mas, estirada na quermesse do seu braço,
quanto mais em tua carne me apego,
mais ardente e etéreo é o desejo.

minha tv em off,

atentado violento ao pudor. 
Je suis or not Je suis,
                eis a questão.

2 de fevereiro

jogarei preces a yemanjá
enquanto um deus e outro
segue sendo morto
mundo afora.
voltei a acreditar em um deus. menor.
em deuses pretos, orixás
e os que vem de longe no tempo,
ancestrais primevos e de origem hindu.

nenhum ritual ou abstração
deixa, contudo, esvair dos poros a luta.

a dor por pão não se esquiva.

novos junhos virão obstinados
por vândalos encapuzados
à espreita de promontórios 
de sonhos de liberdade.

o amor mais acende

o vermelho em mim

esse ano é de levante

e desapego. 

se te assalto
é porque te demoras,
              pássaro esquivo.