terça-feira, 15 de abril de 2008




pinta um piano, talvez num manso desejo de tocá-lo, tanto quanto escreve uma árvore, cheia de vontade de subi-la (o passarinho talvez pouse). já assim pessoa tentava dar um pouco de sentido à certeza de faltá-la completa, um entregar-se absoluto para o texto que não se sabe, para a palavra que será dita inesperada, para a menina que come chocolate, sua máxima filosofia. sentir-se a menina de pessoa é um jeito digno de ser filosofia, é um jeito digno de materializar-se. mas a menina que lê não gosta tanto de doce assim. sobra o outro lado, escrever a menina, escrever o chocolate, escrever a pequena enquanto o amor ausenta-se. pinta um piano. bonito, o piano da menina? a menina o escuta. ele toca na sala, sozinho. ele é assim, de fundo laranja de tanto chupar mexerica (a menina danou-se a pintar também, de vez em quando). cheira a mexerica. mexerica parece mais com jeito de pessoa. mulher-mexerica. não um nome de fruta que se descasca, que se chupa, que espirra gota invisível nos olhos. vem cheiro de janta de algum lugar. janta tem cheiro de família. janta tem cheiro de mãe. janta tem cheiro de casa cheia. a menina não janta desde que virou gente grande sozinha na cidade grande. cheiro de carne cozida com batata e cenoura (hum, feijão com arroz, farinha, pimenta, abóbora e carne de sol!). a menina está sozinha e há um pouco de felicidade na solidão. e um pouco de tristeza também. isso é irremediável. a menina está sozinha e vai atravessar a rua enquanto o seu amor não vem. a menina sou eu