quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

egolatrias

há falta do outro dialético, do pólo que intermedeia, da voz silenciosa que atiça. o movimento é circular, em rede, não se conforma na solidão, busca um ponto ativo, uma voz no outro, do outro, para o outro. e há um mundo já constituído, em ti, que me chega com a complexidade necessária para que o tumulto se firme produtor de frases. há o desenho de um cenário que te tem por personagem, que me chegou vagamente até confirmar-se ao te conhecer. o cenário tem minha cidade, minha solidão nela, a música na solidão da cidade carregada de afetos, amores perdidos, refeitos, esticados, revividos. você é uma representação, um ser único e milenar. o reflexo de muitas buscas, encontros e desencontros. não haverá encontro e ponto. não haverá. minha palavra cessará, a sua também, permaneceremos, nem sei se meu olhar terá o seu, nem sei. não será em vão o que foi provocado. o sentimento mantém a energia ativa, mantém a pele viva, mantém, no cotidiano, a perspectiva e a perplexidade com tudo o que não inspire arte... começo a entender... "um pensamento desejante, movido por uma atenção plural e proliferante; uma estratégia do espanto; finalmente, algo propriamente corrosivo." percebo mutações ao ler, mas ainda não as apreendo, preciso de mais tempo para captar a forma, sutilmente, como quem diferencia pontos luminosos na noite. é preciso reconhecer o brilho, diferenciar a intensidade dos tons, a distância da luz... diz da liberdade, do desapego, do vácuo... serão sinônimos? a grande questão existencial, para mim essencialmente literária, é aprender a desprender-se, um desprendimento que requer reconstrução, refundação, renascimento. não sei o porquê da existência, às vezes me parece um equívoco, às vezes uma embriaguês, noutras se enche de sentido,... a carência de sentido como uma das mais belas descobertas, porque firmada em lápis de cor, pronta a constituir vida. a filosofia ensinando a desmantelar castelos. sobra uma praia cheia de areia. isso pode ser tudo, isso pode ser nada. parir significado a tudo, o tempo todo, dói. dói ser inteiramente responsável pela existência inteira, pelo mundo inteiro, por tudo que vejo, por tudo que toco, por tudo que falo, dói perceber a pulsação da vida em cada poro, em cada átomo, sentir o coração bater, a língua salivar, o olho lacrimejar, o amor nascer, o ruído da cidade, a intensidade da luz, a dor do outro, minhas limitações infinitas, minhas múltiplas possibilidades, minha finitude, tudo o que não serei, o quanto me iludo com minha frágil experiência... o movimento exige minha postura, minha palavra, meu ato, minha disposição, e eu quero parar, deitar-me na areia e contemplar o céu azul estático, a montanha que aparentemente não se move, a nuvem que segue vagarosa, eu quero menos barulho, mais delicadeza. uma música, elomar, uma música.

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