domingo, 25 de novembro de 2012
terceira margem
já é quase outro dia
e eu ainda sem dormir
presa moribunda
de uma insônia sem fim
ouço lá fora
uns primeiros passos
na rua coberta de neblina
me levanto ligeiro
e pela fresta da janela
avisto definidos
tornozelos
reconheço Zefa
com a mesma saia retalhada
onde inda ontem
enfiei meus gloriosos
dedos
mas onde vai tão cedo
e nessa pressa?
certamente pulou
dos fundos a cerca
não me aguento e saio
sorrateiro ao seu encalço
me escondendo à distância
na névoa gelada da madrugada
meia calça rasgada
puta que pariu!
como pode tão cedo?
ela desconfia e olha pra trás
eu me escondo num poste
porém sabendo descoberto
me revelo
ela grita e corre
eu estático permaneço
dou trégua de uns minutos
mas vencido pelo mesmo ímpeto
cego a me tirar de casa
sigo adiante encoberto
pela cúmplice fumaça branca
do tempo
ela vira a direita
e pega a viela que dá no Chico
Nhô Joaquim me cruza a rua
"Mordida de formiga
na cama, Juca Dido?"
eu sem responder sigo
ele se vai sem tino
desço o beco e
do espanto uivo um grito
Zefa se lança do mirante
mas antes me olha penetrante
com a cara inchada do murro de ontem
bem quando toda a neblina
por um sopro do diabo
se desfez
ela surge das águas
após o mergulho
e nada pra outra margem
lutando em fúria selvagem
nunca a vi assim tão brava
contra as correntezas do rio
do outro lado
um barquinho de pescadora
com uma velha senhora
a resgata
agora já não mais me olha
vai-se embora
e eu de cá a gritar feroz
até o barco se perder de vista
volta aqui Zefa volta aqui
na beira do rio sem passos
ficamos eu e seus longos e
vermelhos
saltos altos.
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